6 de set. de 2007

Tempestade em copo d'água


CartaCapital,

edição nº460, 5 de setembro de 2007 - Ano XIII
tiragem: 73.700 exemplares
preço: 7,98 reais
60 páginas, 5 páginas de anúncios (3 páginas de anúncios privados, 1 página de anúncios estatal na revista normal, 3 páginas de anúncio privado no encarte Retrato do Brasil(7 pág.) e 3 páginas de anúncios privados no mesmo encarte)

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Na CartaCapital dessa semana, o tema da capa e de seu editorial, como não podia deixar de ser, é o processo contra os acusados do mensalão. A postura da cobertura da revista é coerente com sua posição política e, claro, evidencia novamente os postulados básicos dessa publicação.

Na matéria, assinada por Sergio Lirio, a grande tese defendida pela revista é a de que os acusados têm de ser julgados em um processo jurídico idôneo, em que os réus tenham direito a defesa. É repetidamente atacado o julgamento precoce pela imprensa, pois o mesmo é claramente dirigido pelo interesse dos grupos representados por esses meios, ou seja, a elite. Também é atacada a memória curta da Justiça, incapaz de partir à caça dos casos de caixa 2 do passado para limpá-los no molde da operação Mãos Limpas italiana. Para garantir o bom funcionamento da república, deve-se respeitar as instituições e os modos de funcionamento delas, o que implica na existência de um Judiciário neutro e, 'novidade', justo.

Em nenhum momento a matéria ou a publicação assume uma postura de defesa dos acusados como inocentes ou um apoio chapa-branca às determinações do governo. O ponto principal e constante de CartaCapital, e pelo qual considero a revista importante no panorama da mídia brasileira, é sua busca pelo bom funcionamento de um Estado mais justo, cumpridor de suas próprias regras e progressista.

No entanto...

A defesa do melhor funcionamento do Estado republicano brasileiro, nos moldes institucionais de hoje, é, na verdade, a defesa de um Estado que representa primordialmente os interesses de uma elite econômica da sociedade. Afinal, junto com todo Estado existe uma classe dominante, isso é inerente a ele, e junto com toda classe dominante, uma outra dominada. É importante evidenciar essa natureza do Estado e do governo e sua interessante posição, ultimamente, como alvo de ataques constantes, assim como a tentativa da criação de uma cultura anti-Estado, na qual 'estatizante' é uma palavra considerada sinônimo de arcaico, atrasado. Como que um instrumento de manutenção no poder da classe dominante, o Estado republicano, pode ser alvo de tantos ataques vindos dessa mesma classe dominante (vide Cansei)? É simples a resposta ao meu ver: a possibilidade, ainda que muito remota, do mesmo vir a servir também a alguns interesses de outros (sim, o ignorante povo).

Ao defender um Estado legalista, que cumpra realmente a Constituição estabelecida, a revista CartaCapital acaba, na visão da elite brasileira, a defender automaticamente o atual governo e a nunca-mencionada, talvez imaginada, extinção de alguns de seus privilégios de classe, provenientes do funcionamento atual do Estado. Em termos de uma mudança significativa da estrutura da sociedade brasileira, o fim desses privilégios de Estado seria o mínimo razoável para alguma melhora, mas, conhecendo nossos coronéis, é claro que isso já é demais.

Outros destaques da edição são o encarte Retrato do Brasil, cujo tema é a questão energética, e uma matéria sobre a expansão da banda larga no país, muito interessante.

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Enric "Grama" Llagostera

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