28 de ago. de 2007

Métodos e Técnicas de Pesquisa


Na Folha do último domingo (26/08/2007 - Edição nacional) é impossível não notar o Caderno Especial sobre os hospitais paulistas, seja pelo seu conteúdo – são 22 páginas de ponta a ponta, pouco menos que o Caderno A, o principal – seja pelo enorme destaque na capa – a primeira chamada, com direito a foto e tudo mais.

Baseado inteiramente em pesquisa realizada pelo Datafolha, o Especial aponta os melhores hospitais dentre 343 (45 públicos, 28 filantrópicos e 270 particulares) da capital paulista. Para isso, foram ouvidos “mil médicos entre os dias 10 de maio e 20 de junho. Profissionais de várias especialidades atuantes em hospitais e clínicas foram questionados sobre as melhores entidades da cidade e as características que as diferenciam das demais.”.

Todas as entrevistas foram realizadas por telefone e a proporção de médicos dentre de cada especialidade foi respeitada, ou seja, “a quantidade, por exemplo, de cardiologistas (3%) e ortopedistas (4%) é equivalente à divisão de especialidades dos profissionais e atividade na capital. O mesmo vale para recortes por sexo, idade e tempo de conclusão de curso e para a divisão entre os que atendem em hospitais (76%) e em consultórios (68%).”

O resultado não chega a ser surpreendente. No geral, em resposta única, os 5 melhores são: Albert Einstein (43%), Sírio-Libanês (18%), Oswaldo Cruz (15%), Hospital das Clínicas (7%) e São Luiz (5%). Quanto às especialidades, em resposta única, na área de Cardiologia o InCor/HC (50%) foi o mais citado, em Maternidade o São Luiz (33%), em Oncologia o Sírio-Libanês (31%), em Pediatria o Albert Einstein (29%) e em Ortopedia o Oswaldo Cruz (19%). Na grande maioria das respostas, agora múltiplas, o que mais pesou na escolha dos hospitais está a equipe médica e os equipamentos, ambos com média de 58%. Esse panorama da saúde na cidade de São Paulo só confirma aquilo que muitos paulistanos sempre souberam.

Questão de Método

No entanto, um dos aspectos mais interessantes e que talvez não seja percebido como importante está logo nas duas primeiras páginas. Na primeira, por Cláudia Collucci, toda a metodologia da pesquisa é devidamente detalhada e esmiuçada. As informações reproduzidas nos parágrafos acima foram extraídas de lá.

Já na página seguinte acontece um interessante debate sobre como se avalia a qualidade de um hospital. Maria Manuela dos Santos, superintendente de uma das empresas privadas especializadas ouvidas afirma que “os médicos escolhem um hospital pensando para onde iriam se ficassem doentes. Eles fazem uma opção de classe.”, “a avaliação do médico é muito subjetiva e normalmente focada na experiência pessoal de cada um”, conclui o texto. Já Haino Burmester, coordenador do núcleo técnico de um programa de qualidade hospitalar gratuito mantido pela Associação Paulista de Medicina e pelo Conselho Paulista de Medicina, questiona as certificações pagas. “Elas preparam a organização para a certificação de qualidade e elas próprias certificam. Guardadas as proporções, é como ‘pôr a raposa para cuidar do galinheiro’.”.

O que a Folha faz logo no começo de todo o Especial é fornecer ao leitor informações para questionar a legitimidade de toda sua pesquisa, conseqüentemente de todas as conclusões derivantes dela. Sabemos de antemão com quais argumentos estamos lidando. Tal atitude contrasta enormemente com a de outros veículos jornalísticos que não se dão nem ao trabalho de conceituar expressões subjetivas empregadas em seu texto. Caso da Veja e a reportagem sobre o livro do professor Alberto Carlos Almeida, em que o termo “elite” era usado de pelo menos 4 maneiras distintas, o que provocava inevitavelmente uma confusão de sentido que poderia levar o leitor desatento a conclusões precipitadas.

Apesar da clara distinção entre estilos de jornalismo da Veja e da Folha neste dois casos, não é possível concluir que um seja melhor que o outro. Existe sim, um maior respeito por parte da Folha para com a inteligência do leitor. São apresentados números, dados, debates e toda uma sorte de informações que deixa o leitor à vontade para tirar suas próprias conclusões, inclusive quanto à veracidade do que lê.

Sim, era um Caderno Especial de 22 páginas sobre um tema relativamente neutro, e que foi abordado com neutralidade, politicamente falando. Bem diferente do conteúdo da reportagem da Veja, que tinha entorno de 8 páginas. Resta agora analisar a abordagem de um mesmo tema pelos dois veículos.

Douglas Lambert

Link para o Especial da Folha aqui. Só para assinantes.

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