Faça o que tiver de fazer para erradicar de uma vez por todas as suspeitas de que pretendia, com os seus decretos na área, “flexibilizar” a autonomia das universidades estatais paulistas, o governador José Serra não poderá fazê-lo antes de uma preliminar. Trata-se da remoção de um obstáculo que cresce e se expande sob outras formas e em outros ambientes na mesma medida em que permanece intocado para todos os efeitos práticos: a ocupação do prédio da Reitoria da Universidade de São Paulo (USP), que completa hoje 28 dias.
Desde que a Justiça, em 20 de maio, concedeu à instituição o mandado de reintegração de posse já tardiamente requerido, o governo parece ter adotado a estratégia da paciência, como indica a conduta de Serra, na expectativa de resolver o problema pelo diálogo. Uma atitude em princípio compreensível, considerando as abrumadoras implicações da alternativa do ingresso de força armada no campus para desalojar os invasores da sua principal instalação administrativa e símbolo maior. A última vez que policiais entraram na USP foi no ano de 1969, de triste memória.
A opção pela estratégia da paciência teria sido sensata, fossem outras a mentalidade e as intenções dos ocupantes, e não estivessem, como sempre, apostando no quanto pior melhor os setores marginais da comunidade acadêmica - atuantes notadamente no sindicato dos funcionários -, que a eles se aliaram, oportunisticamente, para expor o tucano José Serra ao maior desgaste político possível. Já se disse que a insensibilidade do governador para as previsíveis reações das direções universitárias aos decretos que entenderam ser lesivos à instituição ressuscitou o que há de mais obscurantista e autoritário no campus da USP. Dizemos ressuscitou porque as forças desse grupo pareciam esvaídas por inanição.
Pois a cada dia que passa - e com o apoio também da minoria de docentes grevistas, carbonários de avental branco - elas parecem se robustecer no incentivo aos invasores da Reitoria a não arredar pé das suas disparatadas exigências para pôr fim à ocupação. Não foram uma nem duas as reuniões de autoridades com os alunos para uma solução pacífica do impasse. E cada uma, além de desembocar numa seguinte igualmente inócua, produziu dois adversos resultados que se complementam. De uma parte, a desmoralização do governo. De que adianta um secretário estadual afirmar que “eles têm de cumprir a lei, antes de mais nada”, se não a cumprem e fica por isso mesmo?
De outra parte, o saldo - por assim dizer - das negociações é o robustecimento da convicção dos ocupantes de que o tempo joga a seu favor: quanto mais tempo permanecerem entrincheirados, não só mais arriscado será retirá-los com intervenção da PM, como mais disseminado será o efeito da demonstração de sua resistência, atingindo, como de fato já atinge, a Unicamp e a Unesp.
Esse fortalecimento, além do mais, pode encorajar os transgressores da lei a fazer novas exigências. Amanhã eles poderão perfeitamente dizer que só sairão depois que a Justiça se manifestar sobre a ação em preparo sobre a alegada inconstitucionalidade dos decretos da discórdia.
É claro que não se pode saber com certeza qual o momento ótimo para a decisão de forçar os alunos a sair com o menor risco possível de incidentes maiores. Mas claro está que já se passou daquele ponto, provavelmente cristalizado no final da semana passada, quando era de “fim de festa” o clima percebido pela imprensa no prédio da Reitoria.
A esta altura, a hipótese de vencer os invasores pelo cansaço, mantendo a posição de discutir as suas reivindicações apenas depois da desocupação espontânea, se torna menos provável a cada dia que passa. Tendo chegado até aqui acumulando forças para prosperar na ilegalidade, por que haveriam os alunos de aceder às exortações da autoridade?
Além disso, eles estão sendo incentivados pela deplorável conduta de professores que se dizem democratas e legitimam a invasão pela recusa de se pronunciar sobre ela. A estratégia da paciência só se justificaria se, numa avaliação realista, a demora para agir prometesse resultados melhores do que uma rápida ação da polícia. Mas esse não é o panorama visto da seqüestrada Reitoria da USP.
4 comentários:
A pergunta que fica é: o que seriam "carbonários de avental branco"?
pior se fossem carbonarios brancos de avental.
"transgressores da lei" , o estado chega a ser engraçado...
segundo o houaiss
CARBONÁRIO
Datação
1836 cf. SC
Acepções
■ substantivo masculino
1 membro, adepto ou simpatizante da carbonária ('sociedade'); carbonarista
2 Derivação: por extensão de sentido.
membro de qualquer sociedade secreta com fins revolucionários
■ adjetivo
3 pertencente ou relativo a carbonária ('sociedade')
Etimologia
it. carbonaro (1816) 'carvoeiro, carbonário'; há quem explique o t. pela linguagem: os membros da sociedade secreta teriam sido assim designados em função de usarem em seu linguajar palavras técnicas próprias dos carvoeiros; JM e AGC afirmam que o voc. provém do fato de os membros da sociedade secreta carbonária se reunirem (fins do sXVIII) em cabanas de carvoeiros, em Nápoles; ver carbon-
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ahhh tá...
nossa, sociedade secreta então hein?
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