25 de mai. de 2007

Texto: Verdades e mentiras na universidade

Texto retirado da Folha de S. Paulo - 16/05/2007
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1605200708.htm

ANTONIO CARLOS MENDES THAME

Fala-se de "decretos" que afetariam a autonomia universitária, mas, como eles não existem, nunca se menciona seu conteúdo

NUM COMUNICADO conjunto, os reitores das três universidades estaduais paulistas, que têm um acervo único e precioso de grandes contribuições ao desenvolvimento e à cultura do país, fazem um balanço de encontros e esclarecimentos sobre o princípio da autonomia universitária. "Apesar dos temores despertados pelos movimentos iniciais do novo governo, não há, neste momento, condições objetivas nem razões para acreditar na interrupção do princípio constitucional em que se baseia", escrevem os reitores. "Houve conversações e os entendimentos chegaram a bom termo."
Os últimos meses foram pródigos em proclamações sem apoio em fatos. Incapazes de uma mobilização genuína, certas lideranças divulgaram inverdades, manipularam informações e estimularam atos de vandalismo, como a ocupação da reitoria da USP.

O governo é acusado de ferir a autonomia universitária, cortar recursos e ameaçar a liberdade acadêmica. Fala-se que os professores serão prejudicados na aposentadoria. São afirmações falsas, desinformadas e até ridículas. Fala-se de "decretos" que afetariam a autonomia universitária, mas, como eles não existem, nunca se menciona seu conteúdo. Exemplos.

1) As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, nos termos da Constituição. Não há questionamentos quanto à sua liberdade de ação. Nem por isso elas deixam de estar sujeitas às normas legais da execução orçamentária a que estão obrigados todos os entes da administração pública -normas que se impõem até ao Legislativo e ao Judiciário, que, mais que autônomos, são Poderes estatais independentes.
Para todos os órgãos do Executivo, para as universidades, o Judiciário e o Legislativo, as regras são as mesmas.
Elas constam da lei orçamentária em vigor, à semelhança do que figurou nas leis que a antecederam, desde a Constituição de 1988: a autorização para abrir créditos suplementares e remanejar recursos é dada pela Assembléia Legislativa ao Executivo.
A lei é clara: tais providências se inscrevem no âmbito da competência legal do chefe do Executivo, sem que, até hoje, o presidente da Assembléia ou o presidente do Tribunal de Justiça sentissem sua autonomia ameaçada. Por que deveriam sentir-se ameaçadas as universidades?

2) Os recursos para as universidades têm aumentado em vez de diminuir. Em 2006, a elevação foi de 11%, em parte devido a uma anistia fiscal no final do governo Lembo. Por razões legais, os recursos decorrentes dessa anistia não poderiam ser transferidos antes de a Assembléia aprovar o Orçamento de 2007, o que só ocorreu em março. Foi também a demora na aprovação do Orçamento que obrigou a um contingenciamento, o qual abrangeu toda a administração pública -e não só as universidades- e que durou apenas dois meses.

3) Alega-se que a criação da Secretaria de Ensino Superior pode arranhar a autonomia universitária. É ridículo. Todo órgão público precisa estar vinculado a uma secretaria de Estado. As universidades já foram vinculadas à Casa Civil e à Secretaria de Ciência e Tecnologia. A criação de uma secretaria específica somente amplia o espaço político-administrativo das universidades.

4) O Conselho de Reitores das Universidades de São Paulo envolve um debate enganoso. O Cruesp não tem poder deliberativo, raramente se reúne. Dele já faziam parte os três reitores das universidades públicas e duas secretarias. Com a Secretaria de Ensino Superior, atribuiu-se ao secretário correspondente a presidência do órgão. Quando, há três meses, os reitores esclareceram que preferiam manter a presidência, o governo promoveu o retorno à situação anterior.

5) Apresenta-se o simples registro dos gastos das universidades no Sistema Integrado de Administração Financeira como ameaça à autonomia. Não faz sentido. A política salarial, de recursos humanos e de investimentos são assuntos internos das universidades. O TJ e a Assembléia Legislativa, que são poderes independentes, também estão no Siafem-SP, sem que isso lhes tenha trazido dificuldades.

6) No debate sobre aposentadoria, os representantes das universidades têm a mesma posição que o governo do PSDB, para quem não se deve fazer distinção entre funcionários efetivos e os da lei 500 e assemelhados, impropriamente chamados de "temporários": todos devem permanecer no regime público. Isso contraria o governo federal e o PT nacional. A universidade conserva o poder de conceder aposentadoria a seus membros. A comunidade acadêmica terá um representante no conselho da SPPrev.

A política moderna criou a lenda de que a divulgação repetida pode transformar uma mentira em verdade. Mas a mentira é sempre uma mentira. Basta querer enxergar.

ANTONIO CARLOS DE MENDES THAME, 60, deputado federal, é presidente estadual do PSDB-SP e professor licenciado de economia rural da ESALQ/USP.

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